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uma observadora

Thursday, November 29, 2007

"Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Principalmente quando sonhamos e temos a dor da descoberta e a delicia do orgasmo. Acordei rindo hoje, e eu que nunca tive nada dele, nem uma mecha de cabelo, uma foto, a lembrança da voz, nunca gostei dele, da aparência, do não dizer o que ele diz. Mas foi um sonho memorável.

Estávamos em uma praia onde acontecia um luau de final de ano, muita bebida e taças espalhadas por longos caminhos de areia coberta com palhas e frutas, estrelas brilhavam cintilantes no céu e eu estava sozinha na beira da água, teria de pular as sete ondas para trazer sorte no ano novo, e ele estava lá o tempo todo me olhando e eu não percebia. Levantei-me peguei uma garrafa de bebida e fui afastando-me das pessoas que estavam conversando e ouvindo música para ficar um pouco mais a só comigo mesma porque "De perto ninguém é normal" e me considero a menos normal de todas para estar com os que se consideram normais.

O ano novo aconteceu e eu não vi nem ouvi. Dormi na areia da praia. Quando acordei lembro de ter pensado: cadê meu celular? Minha bolsa? Minha digital? Olhei para os lados e não encontrei, comecei a correr de volta para onde estavam todos e quando lá cheguei havia pouco mais de vinte pessoas e uma delas era ele, vestido com uma calça branca de linha e uma camisa branca quase transparente, de tão fina eu podia ver seu corpo magro pela camisa e os pêlos grisalhos de seu peito. Cabelos finos levemente ondulados quase grisalhos, parei em frente a ele com a respiração ofegante e as mãos apoiadas nos joelhos e perguntei por minhas amigas, como se ele as conhecesse: então ele me disse sorrindo:

- “O que você procura?”

Fui recuperando a respiração aos poucos e lembro de como ele me olhava, tive a impressão que ele podia ver e ler minha alma. Comecei a lacrimejar, então ele estendeu a mão para mim e disse:

Suba!

Olhei a mão daquele homem estendida para mim, era magra e delicada, suave ao toque, mas firme, segurei a mão dele e consegui subir o primeiro degrau de madeira que fazia parte da longa escada que nos conduziria até uma rua de terra vermelha batida, cheia de buracos e pedras. Ele então subiu a escada segurando minha mão e do topo dela me fez olhar novamente para a praia e perguntou:

- “O que você perdeu?”.

E, olhando aquela areia e imensidão de mar no meio de uma madrugada de ano novo, sem minhas amigas, sem sapato, sem saber onde estava minha bolsa com documentos, celular, digital e, segurando na mão de um desconhecido por quem estava inebriada, respondi: Nada!

Começamos a caminhar pela estrada de terra vermelha cheia de buracos e pedras que nos levaria a um caminho que eu conhecia, pois era o que mesmo que fazia para ir para o lugar onde estava hospedada, casa de uma de minhas amigas.

Andávamos de mãos dadas e vez por outra nos olhávamos, passamos pela casa onde eu estava hospedada, mas a mão daquele homem era tão macia, quente e tão suave ao toque que sem fazer força ele poderia me levar onde desejasse, não olhei para trás para ver a casa onde deveria ter ficado tamanho foi o medo que me dominou dele largar minha mão apesar de não a estar segurando totalmente. Ele parou e perguntou:

- Seus pés estão doendo? Ainda vamos caminhar bastante.

Eu parecia estar completamente hipnotizada, havia acabado de passar por onde deveria ficar e estava caminhando com aquele desconhecido, sem sapatos, sem uma identificação e respondi:

- Não! Eu estou flutuando!

Ele então me lançou um olhar doce e sorriu. Os olhos daquele homem pareciam de um músico, de um pintor de almas, ele tinha encontrado a louca certa para acompanhá-lo onde desejasse, não precisava cantar, falar, pintar, ele só precisou oferecer a mão e me olhar como olhou que eu o seguiria até os confins do inferno.

De repente paramos, uma cabana estava a nossa frente, o telhado era de folhas secas de coqueiro e as paredes eram lençóis brancos que flutuavam com o vento, parecia uma casa fantasma, era totalmente linda, ela não aprisionava. Nas cercanias não havia vizinhos, barulho, somente uma imensidão negra pela noite, então ele afastou um pouco um dos lençóis-parede e entramos, em uma das pilastras de madeira havia um violão branco com detalhes dourados encostado, do outro lado um enorme colchão no chão coberto por lindos lençóis brancos e finos, almofadas brancas com rendas trabalhadas nas pontas, em volta de todo o colchão havia palhas secas circundando-o como raios de sol. Era o lugar mais lindo que eu já tinha visto em toda a vida.

Havia uma cadeira branca onde ele me fez sentar, sorriu e saiu, quando voltou trazia nas mãos uma bacia com água e uma toalha branca. Colocou a bacia no chão próximo a meus pés e disse:

- "Coloque seus pés nesta água, não devemos levar pra cama o sofrimento e sangue espalhados ou conquistados no caminho".

Eu não pensava, eu só obedecia, então ele se afastou de mim, pegou o violão e começou a cantar:

"lua na folha molhada
brilho azul-branco
olho-água, vermelho da calha nua
tua ilharga lhana
mamilos de rosa-fagulha
fios de ouro velho na nuca
estrela-boca de milhões de beijos-luz
lua
fruta flor folhuda
ah! a trilha de alcançar-te
galho, mulher, folho, filhos
malha de galáxias
tua pele se espalha
ao som de minha mão
traçar-lhe rotas
teu talho, meu malho
teu talho, meu malho
o ir e vir de tua
o ir e vir de tua ilha
lua
toda a minha chuva
todo o meu orvalho
caí sobre tis
e desabas e espelhas da cama
a maravilha-luz do meu céu
jabuticaba branca"

Eu não respirava, não falava, sentia meu coração palpitar e querer sair do peito, um suor fino escorria de meu pescoço por entre meus seios, eu sentia nitidamente o sangue correr por minhas veias, havia tirado os pés da bacia de água e ele cantava andando em círculos em volta de mim, olhei para cima e as palhas não cobriam totalmente a cabana e era possível ver estrelas brilhando naquela noite escura.

Ele parou diante de mim, me beijou docemente. A boca daquele homem era como uma fruta rara e exótica, doce e úmida, inebriante como um vinho antigo, eu não conseguia sentir meu corpo, mas sabia que ele estava me tocando por entre as pernas, sentia seus dedos dedilharem por entre minhas coxas como ele fez com seu violão.

Fizemos amor e era possível ver o brilho de seus olhos e a paz que inundava meu ser, às vezes ele falava coisas que me pareciam incompreensíveis, mas agora possuem grande significado, até seu silêncio era revelador.

Acordei, com um sol forte acima de mim, olhei a minha volta, uma garrafa de Absinto ao lado, as ondas da praia banhando meus pés, meu celular, bolsa e digital de um lado, do outro, um cachorro labrador com o qual estava abraçada, enorme, amarelo, de olhos amarelos e brilhantes, com uma coleira que dizia:

Feliz Ano Novo! Com amor,
Caetano

Por Izd Sun Ril
29/11/2007

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